Um dilema para observar: Eu não sabia se, naquele dia, eu ia como estudante de jornalismo (com bloco de anotações, gravador, senso crítico mode on) ou somente como um visitante qualquer do Templo Fo Guan Shan. Foram mais de 40 dias para eu escolher o que eu iria observar, e durante todo esse tempo ficava imaginando o que seria mais difícil, digamos mais desafiador (porque o que alimenta a alma de um (aspirante à) jornalista são os desafios). Gogoboys, prostitutas, skatistas, Culto Evangélico, Reunião Espírita, festa num terreiro de Umbanda... E enfim, Templo Budista. Eu precisava conhecer alguém ou alguém que conhecesse outra pessoa envolvida de alguma forma no grupo escolhido para ser ponte para eu chegar onde queria.
Deixaria em casa todas as visões pré- formadas que eu tinha, mas ao mesmo tempo teria de ir com algum conhecimento básico daquilo que iria observar. Tinha muitas dúvidas, e onde levá- las, como tirá- las, se eu estava apenas visitando o local? “Pessoas orientais, calmaria, lerdeza. Zen”. Isso tudo eu imaginava que encontraria num templo budista. Mainha me disse: “Vai sozinho? Eles vão querer te converter!” E minha mãe sempre me diz para eu não julgar nada nem ninguém. Budismo é religião? Foi a minha primeira dúvida. A colega que me acompanhou, minha confidente, disse- me que era estilo de vida.
Não vou mentir, estava tenso. “Pode entrar. Fique à vontade.” Quando ouvi essa frase, fingi que estava, super, em casa, bem à vontade. Tratei logo de matar a primeira curiosidade (aquela se Budismo é religião, estilo de vida ou o quê?). A moça me deu um livrinho, que por incrível que pareça fica logo na entrada numa das estantes no grande salão cheio de mesas e livros. Entendi que é a mesma dúvida de todo mundo que não tem conhecimento algum. Aprendi que Budismo é ciência, religião e filosofia de vida. Assistir à celebração descalço, cânticos em outra língua, várias imagens (e o que elas significam?), oferendas (concretas) à elas, a Monja, as roupas, o silêncio, a interação, a concentração, a mudra (tipo o sinal da cruz), o Sutra Lótus (livrinho de ensinamentos), o Bodshisattva Avalokiteshvara (um dos budas), a meditação e o incenso. O incenso, aliás, foi a única dificuldade que me venceu. Para um alérgico, passar mais de duas horas numa sala com cerca de 40 pessoas e todas com um, era quase impossível sair de lá sem os olhos vermelhos e uma vontade gigante de espirrar. E como eu anotaria tudo? Pensei mil vezes se levaria algo para registrar. E ele, sempre ele, é meu confidente, mais que minha colega. O caderno de anotações. Contava tudo para ele e ele não tinha reação alguma. Em casa, ele me contou tudo.
Dali eu precisava sair, segundo as doutrinas dos Budas, com o coração cheio de generosidade, compaixão, alegria e equanimidade. Dessa última palavra fiz ligação direta e imediata com o Jornalismo. É sinônimo de imparcialidade e neutralidade. Não fui imparcial nem muito menos neutro, porém, estava, sim, como estudante de jornalismo (e que precisa ser “imparcial”), mesmo que camuflado de um visitante qualquer. Participei, rezei, perguntei, cantei, anotei, gravei, fotografei. Não queria perder nada.
O que a princípio seria difícil, no final tornou- se muito fácil. Não sei se porque eu me despi de todas as visões pré- formadas, ou se elas faziam sentido, de alguma forma. O respeito mútuo foi fundamental para o sucesso da observação.
Fui com pré- conceitos e saí sem preconceitos. Nada daquilo que parecia estranho era tão estranho. Na verdade, o que faltava era conhecimento, familiaridade. Tudo faz parte de um só mundo: O que vivemos. Em busca da perfeição, e, no mínimo, de paz e harmonia.
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